domingo, outubro 22, 2006

Mudei de morada

Por razões de operacionalidade encontro-me agora neste novo espaço.
Gostaria de continuar a contar com o vosso contributo e a vossa paciência para me aturar.


Obrigado e até sempre

segunda-feira, setembro 25, 2006

RETALHOS - A Viagem (IV) fim


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A contra gosto lá me levantei. Os camaradas suspenderam a batota e fomos ver o que se passava. Tremenda algazarra com o pessoal do Exército a assistir a uma sessão de batatada no convés entre dois ou três Páras e outros tantos Comandos. Sempre que a rivalidade entre Páras e Comandos conduzia a este tipo de “combates”, o pessoal do Exército regozijava-se pois não gostavam dos Comandos nem pintados. Quando se pressentiu que tudo poderia descambar em algo grave, pois um Pára teimava em empurrar pela borda-falsa o seu adversário, alguém desapertou os contendores e aquilo morreu ali. Se entre marido e mulher não se mete a colher, entre militares não é muito diferente pois ninguém vai fazer queixinhas a seguir. Eu, que estava bem sossegado a ver as “habilidades” dos jogadores da batota no meu camarote, é que acabei por levar por tabela. De repente, como cabo de dia vejo-me a responder pelos actos de cerca de cinco dúzias de pára-quedistas que comigo embarcaram. Como dois ou três, se lembraram de andar à pancada… fui avisado que mal chegasse a Luanda, iria ser responsabilizado pelo ocorrido, por não ter identificado os Pára-quedistas intervenientes.
Como tinha alguma habilidade para o desenho, a pedido de alguns, fui tatuando nos seus braços o emblema dos Pára-quedistas. Assim os dias foram passando numa rotina que me começava a assustar. Já nada nos intimidava nem a viagem nem a guerra que nos esperava. Só nos restava o cansaço, o sono e a saudade. Por isso alguém dizia: “- Já só faltam 104 semanas para regressarmos”.
Foi isso que definiu o nosso objectivo principal e nos norteou todo o tempo: contar semana a semana.
Ao nono dia já se avistava o arranha-céus do Banco Comercial de Angola. O que era um ponto no horizonte, começou a emergir e com ele vislumbrámos a baía lindíssima de Luanda. Quando o Vera Cruz finalmente acostou ao porto de Luanda as tropas desembarcaram e logo, no cais, reparámos num autocarro azul da força aérea, que nos transportou a Belas onde estava instalado o nosso Batalhão de Caçadores Pára-quedistas nº 21.
Já em terra firme, avistam-se os barcos de pesca dos negros, passando lentamente para um e outro lado. Uns pássaros grandes e estranhos que pareciam gaivotas passeiam sem mover as asas, acima das palmeiras. Uns negros maltrapilhos arrastam-se a pedir esmola, outros oferecem cinzeiros de madeira e objectos esculpidos. Uns sujeitos brancos e sebentos trocam escudos por angolares com a taxa acrescida de 12%. Os brancos aqui, de patilhas e camisas transparentes, têm todos aspecto de vendedores de automóveis e de taxistas. As mulheres brancas andam excessivamente bem vestidas e as jovens mulatas são lindas de morrer. Somos rodeados por pretitos, descalços nesta terra poeirenta e vermelha que mais parece barro, com cachos de enormes bananas ao preço da chuva.
E assim terminou esta viagem, ancorando neste Brasil africano chamado Angola.

quinta-feira, setembro 21, 2006

RETALHOS - A Viagem (III)

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Quando se deixou para trás Lisboa e posteriormente a Ilha da Madeira ficou também muito de nós e os melhores anos das nossas vidas. As saudades são já indescritíveis e uma solidão enorme invade-nos. Os soldados lá se acantonam pelo convés e à sombra das baleeiras tentam combater esta ociosidade aliada ao stress de uma viagem para a guerra, mas uma melancolia sem remédio domina-os.
Nos tempos mornos da viagem tínhamos por companhia um mar de água, cuja cor se confundia com um céu de chumbo quente. O sul confundia-se com a guerra e os militares confundiam-se com a família. As memórias de vinte anos, destes rapazes feitos homens, vinham novamente ao pensamento. O Fugitivo, a Lassie, o Robin dos Bosques e o Zorro (séries da televisão) confundiam-se com guerrilheiros. As brincadeiras ao pião e ao espeto confundiam-se com o jogo da lerpa, e essas brincadeiras de crianças confundiam-se agora com a contenda que nos esperava.
Lembro-me do meu primeiro pião de bucho que se confunde também com o meu primeiro roubo. Os piões alinhadinhos na vertical e pendurados numa corda estavam ali como a desafiar-me e eu não resisti: fui ao último e zás… Passados uns minutos já a minha velhota tinha sido avisada. Levou-me pelas orelhas até devolver o pião na drogaria, tudo isto tendo como testemunha o velhinho mercado municipal. E foi precisamente nesse local que acabou por nascer o maior aborto urbanístico (prédio do Coutinho) que há memória em Viana do Castelo. Finalmente, passados trinta anos, está prestes a ser demolido corrigindo e despoluindo o horizonte desta cidade.
Estava eu absorvido pela saudade e divagando pelas minhas memórias quando alguém grita à porta do camarote:
“- Há porrada junto ao cinema e acho que é com os Comandos.”
Quase ninguém se mexeu nem pestanejou demonstrando total indiferença pelos que se entretinham a jogar à galheta. Como eu também não me mexi, pois estava observando a lerpa, algum esperto me alertou:
“- Oh Marques, não és tu que estás de cabo dia? Parece que temos malta nossa envolvida.”
.../...
continua

quinta-feira, setembro 14, 2006

RETALHOS - A Viagem (II)

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Aos praças, como eu, e aos milicianos, a todos era imposta a guerra. Em alternativa tínhamos a deserção que tinha como consequências nunca mais poder pisar solo pátrio e ter de deixar para trás as famílias, cuja maioria era sustentada com os nossos pobres salários. A Polícia Politica (PIDE/GDS) a rondar as casas de cada um, incomodando as pobres famílias mercê dos bufos que, a troco de uns miseráveis tostões, informavam a PIDE de tudo o que lhes parecia suspeito. Com estes condicionalismos, num país em ditadura, só nos restava dizer presente e irmos para a guerra.
Não era uma questão de patriotismo, heroísmo ou cobardia, mas simplesmente os condicionalismos do país.
A vida a bordo de um navio com mais de 3000 militares alojados, cuja lotação em condições normais era cerca de metade, rapidamente se transforma em rotina e cansaço.
O Martins, o magrinho, sempre interessadíssimo pelos pormenores nunca tendo estado tão perto de tanta coisa desconhecida, fazia as suas habituais visitas ao interior do navio e não se cansava de dizer:
“- É espantoso o número de coisas que não sabia e que não se vêem do lado de fora. Estes barcos têm de tudo, sabiam?”
Ao fim do segundo dia a bordo, pelo meio da tarde, avistava-se pela primeira vez a Ilha da Madeira sobre um céu quente, a beleza de um postal ilustrado. Tinha aproveitado para escrever umas cartas para casa, ainda a bordo, pois tinham-nos dito que sairíamos por algumas horas e poderíamos enviá-las da Madeira. Os mais afoitos saíram até onde lhes era permitido, o cais. Parece que tinham medo que alguém, à última da hora, pensasse em fugir à guerra. A maioria nem saiu do barco debruçando-se sobre a borda falsa do navio vendo e deliciando-se com aquela beleza para nós nunca vista.
Tocou a sirene do navio, subiu-se o portaló e depois da contagem do pessoal, o Vera Cruz arrancou em direcção à guerra prometida. Um navio cheio de milhares de jovens feitos homens à força que nem tiveram tempo de o ser, jovens feitos homens para matar, sem tempo para pensar o seu futuro, sem outra liberdade que não a de tentarem cumprir o seu destino programado por outros.
Os militares têm sempre como referência a disciplina e a hierarquia. Nesta viagem pelos mares do atlântico, por ter o número mais antigo entre os meus companheiros de armas, acabo por ficar por eles responsável, como cabo dia, num dos nove dias da viagem.
Nesta viagem rapidamente se instalou a rotina. As noites eram o prolongamento dos dias de batota onde a lerpa e a vermelhinha pontificavam. O “vício” era tal que os mais embrenhados no jogo raramente conseguiam ir tomar o pequeno-almoço. Eu, como tantos outros, não falhava a este “requinte” que nos era servido pelas sete da manhã, hora a que a lerpa ainda não tinha acabado para muita boa gente. Ocupávamos as restantes horas do dia com as idas ao bar e ao cinema que funcionava na coberta superior, para além das refeições que nos eram servidas em pratos ensaiando umas valsas que só os rebordos das mesas evitavam males maiores.
.../...
continua

domingo, setembro 10, 2006

RETALHOS - A Viagem

O VERA CRUZ apesar de ser um navio adaptado a transporte de tropas ainda mantinha as suas linhas de concepção extremamente avançada para a época. Foi o primeiro verdadeiro paquete Português, pois todos os navios de passageiros usados anteriormente se classificavam como unidades mistas, pela grande quantidade de carga transportada a par dos passageiros. Nos pisos superiores alojavam-se os oficiais. Acima da linha do convés, coabitavam os sargentos dos diversos ramos e os militares da força aérea bem instalados, em camarotes triplos. Sentíamo-nos uns privilegiados pois as condições acima da linha do convés eram ainda excelentes.
Nos porões, a carga, neste caso os soldados do exército, foi alojada e dormia em beliches triplos. As condições de higiene rapidamente se degradaram transformando os porões em autênticos “bordéis” de imundice e maus cheiros (embora os soldados não tivessem culpa nenhuma, coitados!). Assim, muitos soldados tiveram de vir dormir para a proa do navio ou estenderem-se pelo chão como deserdados da sorte e não como cidadãos enviados ao serviço da pátria.
Quando se deixaram de ouvir os gritos lancinantes de quem em terra via partir os seus filhos para a guerra, sentimo-nos escoltados por algo maravilhoso e de grande satisfação para toda a gente. Era a primeira vez que tínhamos o privilégio de ver golfinhos. Toda a gente ia à borda contemplar este espectáculo único que se prolongou até ao fim da tarde. Que beleza!!!
A partir do início da década de 70, tudo se complicou para a já pequena população de golfinhos. A poluição do rio, cada vez mais preocupante, e a construção das pontes sobre o Tejo, contaminaram toda a cadeia alimentar. O crescente tráfego marítimo e a não existência de normas ambientais e de conduta na observação destes animais, acabaram por dizimar toda esta população.
Com a primeira noite vieram os primeiros enjoos com excepção para a tripulação e para os militares profissionais. Para estes últimos a guerra era só mais uma comissão de serviço advindo daí mais uma promoção, para alindar os seus ombros, subir na carreira e ganhar mais uns cobres. Só o Fiúza, o pescador, é que estava como peixe na água. Eu como antes trabalhava nuns estaleiros de construção naval, já vinha também um pouco habituado.
Todos os outros viram-se de repente no meio do mar, como prisioneiros do destino comandando pelo leme do deus Ares, conhecido como Marte o deus da guerra com milhares de Phobos e outros tantos Deimos, os seus filhos. Segundo a mitologia, Marte teve dois filhos com Vénus (a deusa do amor e o planeta mais bonito visível, a olho nu, perto do anoitecer ou do amanhecer) Phobos e Deimos (o Medo e o Terror).
Anoitecia rapidamente. Olhando em frente, mal se avistava o horizonte. Os tons vermelhos, como Marte, sugeriam sangue e este, por sua vez, conflitos e guerras. Não é de admirar que o planeta vermelho fosse associado a uma divindade considerada a zeladora do reino dos mortos e o deus da guerra.
Tanto de um lado como de outro não havia sinais de terra. Estávamos sós, completamente abandonados no meio do oceano Atlântico.
Bem dizia o Ramos nas suas tiradas sempre cáusticas:
“- Desta vez concordo! Gosto muito de ter os pés assentes em terra firme”.
.../...
Continua

quinta-feira, setembro 07, 2006

Avô, quantos anos tem?

Uma tarde um neto conversava com o seu avô sobre os acontecimentos actuais.
Então, de repente, ele perguntou: Quantos anos tem, avô?
E o avô respondeu:
-Bem, deixa-me pensar um momento...
Nasci antes da televisão, das vacinas contra a polio, das comidas congeladas, da fotocopiadora, das lentes de contacto e da pílula anticoncepcional. Não existiam os radares, os cartões de crédito, os raios laser nem os patins em linha.
Não se tinha inventado o ar condicionado, a lavadora, as secadoras (as roupas simplesmente secavam ao vento).
O homem não tinha chegado à lua, "Gay" era uma palavra inglesa que significava uma pessoa contente, alegre e divertida, não homossexual.
Das lésbicas, nunca tínhamos ouvido falar e os rapazes não usavam piercings. Nasci antes do computador, das duplas carreiras universitárias e das terapias de grupo. Até completar 25 anos, chamava a cada homem "senhor" e a cada mulher "senhora" ou "senhorita".Nos meus tempos a virgindade não produzia cancro. Ensinaram-nos a diferenciar o bem do mal, a sermos responsáveis pelos nossos actos. Acreditávamos que "comida rápida" era o que a gente comia quando estávamos com pressa.
Ter um bom relacionamento, era darmo-nos bem com os primos e com os amigos. Tempo compartilhado, significava que a família compartilhava as férias juntos. Não se conhecia telefones sem fio e muito menos os telemóveis.
Nunca tínhamos ouvido falar de música estereofónica, rádios FM, Fitas cassetes, CDs, DVDs, máquinas de escrever eléctricas, calculadoras (nem as mecânicas quanto mais as portáteis). "Notebook" era um livrete de anotações.
Aos relógios dava-se corda dia a dia. Não existia nada digital, nem os relógios nem os indicadores com números luminosos dos marcadores de jogos, nem as máquinas. Falando de máquinas, não existiam as cafeteiras automáticas, os fornos micro-ondas nem os rádio-relógios-despertadores. Para não falar dos videocassetes, ou das máquinas de filmar de vídeo. As fotos não eram instantâneas nem coloridas. Só existiam a branco e preto e a sua revelação demorava mais de três dias. As de cores não existiam e quando apareceram, a sua revelação era muito cara e demorada.
Se lêssemos "Made in Japan", não se considerava de má qualidade e não existia "Made in Korea", nem "Made in Taiwan", nem "Made in China".
Não se ouvia falar de "Pizza Hut" ou "McDonald's", nem de café instantâneo. Havia casas onde se comprava coisas por 5 e 10 centavos. Os gelados, as passagens de autocarro e os refrigerantes, tudo custava 10 centavos.
No meu tempo, "erva" era algo que se cortava e não se fumava. "Hardware" era uma ferramenta e "software" não exista.
Fomos a última geração que acreditou que uma senhora precisava de maridopara ter um filho.
- Agora diga-me quantos anos acha que tenho?
- Hiii!!!... Avô. Mais de 200! Disse o neto!
- Não, querido. Somente 57!

terça-feira, setembro 05, 2006

Ao fim de 33 anos... um reencontro


Quando São João da Pesqueira comemora os 750 Anos da Confirmação do Foral de D. Afonso III e simultaneamente 725 anos da atribuição da Carta de Feira Franca, verifica-se desde logo a importância que os vários monarcas foram dando ao concelho incentivando o seu desenvolvimento económico.
O mercador que por aqui passava, o agricultor que aqui vende os bens da terra, o meirinho que cobrava os impostos, o alcaide como figura do poder central são de alguma forma alguns dos protagonistas desta feira da Pesqueira medieval.
Consciente deste passado que por vezes se encontra muito presente, foi neste preciso dia de 1 de Setembro de 2006 e passados 725 anos , que encontrei mais um Irmão da Guerra, o nosso 1º cabo pára-quedista enfermeiro Manuel Lauro
Há mais de 30 anos, sofreu comigo as agruras da guerra em Angola, pois para além de ser um combatente ainda tinha a nobre missão de tratar dos feridos e estropiados da guerra. Agora vestido com a pele de feirante lá vai ganhando a vida de um forma digna.
Um abraço para ti amigo Lauro.

quinta-feira, agosto 31, 2006

Ao fim de 33 anos...


Ao fim de 33 anos, localizei mais um Irmão da Guerra (António Alves) e desta vez em São João da Pesqueira.

O meu amigo Alves desde as matas de Angola até sempre e para sempre um AMIGO

quarta-feira, agosto 30, 2006

Clonagem de multibancos investigada pela Judiciária

Portel viveu ontem momentos de pânico à medida que se avolumava o número de cidadãos burlados, através da reprodução ilegal de cartões multibanco. Cerca de 40 pessoas foram lesadas com levantamentos ilícitos, feitos no estrangeiro, das suas contas bancárias, durante o fim-de-semana. Fonte do balcão da Caixa Geral de Depósitos (CGD) de Portel garantiu ao DN que as pessoas vão ser ressarcidas, mas há "centenas" de cartões clonados nesta vila alentejana.


Para saber como funciona a burla, clique aqui

terça-feira, agosto 29, 2006

As artimanhas dos bancos

.... e vão sacando mais uns dinheiritos e assim vão engordando os seus lucros.




Lucros dos bancos aumentaram 30% em 2005

A banca portuguesa viu os seus lucros crescerem 30% em 2005, face ao ano anterior, de acordo com os dados oficiais do sector, ontem disponibilizados pela Associação Portuguesa de Bancos (APB), no seu boletim informativo.

Juros de Contas Ordenado podem chegar a 21%

O saldo negativo nas designadas Contas Ordenado oferecidas pela banca pode custar 21% ao ano e as instituições não informam sobre estas taxas de juro na Internet, observa o Jornal de Negócios na edição de terça-feira.

A tentação de deixar as contas bancárias entrarem em saldo negativo «é grande, em particular, quando o aumento dos encargos mensais reduz de forma significativa o orçamento disponível dos agregados familiares».
Mas, explica o artigo, ceder à utilização do crédito nas contas à ordem tem um custo muito elevado, que pode chegar aos 21% ao ano, em termos nominais.
E nem as denominadas contas ordenado escapam às comissões cobradas pelos bancos, no caso de se começar a utilizar antecipadamente o ordenado do mês seguinte, uma operação denominada na linguagem da banca por descoberto bancário autorizado.

segunda-feira, agosto 28, 2006

Metade



    E que a força do medo que tenho não me impeça de ver o que anseio.
    Que a morte de tudo que acredito não me tape os ouvidos e a boca.
    Porque metade de mim é o que eu grito, mas a outra metade é silêncio.

    Que a música que eu ouço ao longe seja linda, ainda que tristeza.
    Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada, mesmo que distante.
    Porque metade de mim é partida mas a outra metade é saudade.

    Que as palavras que eu falo não sejam ouvidas como prece nem repetidas com fervor,
    Apenas respeitadas como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos.
    Porque metade de mim é o que eu ouço, mas a outra metade é o que calo.

    Que essa minha vontade de ir embora se transforme na calma e na paz que eu mereço,
    E que essa tensão que me corroe por dentro seja um dia recompensada.
    Porque metade de mim é o que eu penso e a outra metade é um vulcão.

    Que o medo da solidão se afaste, que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável
    Que o espelho reflicta em meu rosto um doce sorriso que eu me lembro de ter dado na infância.
    Porque metade de mim é a lembrança do que fui, a outra metade eu não sei.
    Que não seja preciso mais do que uma simples alegria para me fazer aquietar o espírito.

    E que o teu silêncio me fale cada vez mais.
    Porque metade de mim é abrigo, mas a outra metade é cansaço.
    Que a arte nos aponte uma resposta, mesmo que ela não saiba, e que ninguém a tente
    Complicar porque é preciso simplicidade para fazê-la florescer.
    Porque metade de mim é plateia e a outra metade, é canção.

    E que minha loucura seja perdoada.
    Porque metade de mim é amor e a outra metade... também...

    Oswaldo Montenegro

domingo, agosto 27, 2006

Ser diferente é normal


Um sujeito estava colocando flores no túmulo de um parente, quando vê um chinês colocando um prato de arroz na lápide ao lado.

Ele se vira para o chinês e pergunta:
- Desculpe, mas o senhor acha mesmo que o defunto virá comer o arroz?
E o chinês responde:
- Sim, quando o seu vier cheirar as flores!!!

"Respeitar as opções do outro, em qualquer aspecto, é uma das maiores virtudes que um ser humano pode ter."
"As pessoas são diferentes, agem diferente e pensam diferente. Nunca julgue. Apenas compreenda!"



segunda-feira, agosto 21, 2006

Romaria da Senhora d´Agonia terminou em beleza




Data de 1744 a veneração de Viana do Castelo à Virgem da Agonia, invocada pelos pescadores para que o mar lhes seja benigno. Fixado o dia 20 de Agosto para as festas em sua honra, em 1772 uma portaria régia autorizou a realização de uma feira franca na cidade, nos dias 18, 19 e 20 do mesmo mês. Desde então, a romaria da Senhora d´Agonia tornou-se numa das mais belas, senão a mais bela, coloridas e grandiosas festas populares de Portugal.
Vários cortejos animaram os três dias das festas, acompanhados de muita música e gente bonita que veste os mais belos trajes tradicionais do Minho: o desfile da mordomia, acompanhado por foguetes e bandas de música saúda a Comissão das Festas e os mais altos representantes da cidade, terminando na Praça da República onde os "zabumbas" fazem vibrar os seus enormes bombos e desfilam os "Gigantones" , enormes e estranhas figuras que há mais de cem anos vieram de Santiago de Compostela animar a Romaria d´Agonia; o cortejo etnográfico, com os carros alegóricos que recordam os costumes dos trabalhos do Minho, da terra e do mar, verdadeiro museu vivo de etnografia; o cortejo histórico que conta, numa mistura de lenda e realidade, histórias que marcaram Viana do Castelo.
A admirável procissão do mar simboliza a ligação profunda da cidade com o elemento que lhe forjou a história e parte da sua sobrevivência.
A imagem da Senhora d´Agonia com o seu manto roxo e azul é embarcada numa traineira, entre foguetes e repique dos sinos, e vai abençoar o mar para que ele seja sempre generoso no sustento e na bonança. A embarcação que leva a Senhora navega por entre um cortejo de centenas de barcos com os mastros embandeirados, regressando no final do dia à sua capela barroca, onde as portas ficam abertas para a devoção.
Milhares de pessoas espalham-se por tasquinhas e restaurantes onde a cozinha portuguesa, regada com o vinho verde da região, parece ter um sabor mais vivo, enquanto outras se juntam em redor dos coretos para escutar as bandas de música. Na última noite dos festejos, sobre a ponte centenária do rio Lima, onde se reflectem as luzes das embarcações, uma brilhante cachoeira de fogo de artifício anuncia que a festa da Senhora d´Agonia terminou.

sábado, agosto 19, 2006

Eu estava lá... e gostei

FESTIVAL AÉREO EM VIANA DO CASTELO
Exibição dos "Rotores de Portugal" sobre o Rio Lima.

Integrado nas festividades da Romaria da Senhora d'Agonia, a patrulha de helicópteros da Força Aérea Portuguesa "Rotores de Portugal", demonstraram as suas habilidades nos céus da Princesa do Lima.


Eu estava lá... na Senhora d'Agonia,



A Senhora d'Agonia, a maior romaria nacional, realiza-se este ano entre os dias 18 e 20 de Agosto.
Uma cara bonita, são as Mordomas da Romaria, na ordem das centenas, envergando um dos nossos mais belos trajes, que vão cumprir o dever de apresentar cumprimentos à Autoridade Governamental, à Edilidade e ao nosso Bispo, na companhia dos membros da Comissão Organizadora. Dada a riqueza e alacridade deste Cortejo.

quinta-feira, agosto 17, 2006

Novo jornal gratuito será lançado em Setembro

A segunda quinzena de Setembro vai marcar o lançamento do primeiro número do:- «Diz que Disse»
Um jornal gratuito virado para o "mundo cor-de-rosa", referiu Gonçalo Perenas, administrador do projecto pertencente à Global Share, empresa de comunicação e serviços de consultoria, segundo noticia do Diário Económico. O título, que adoptará um formato tabloide de 32 páginas, terá a direcção editorial entregue a Cristina Molher.
Com cerca de 100 mil exemplares, a publicação incluirá secções de viagens, turismo e festas, entre outras. Depois de no dia 13 de Agosto, domingo, ter sido lançado o número zero do título, distribuído em algumas praias do Algarve, numa acção promocional que contou com a presença de várias modelos, acção repetida no dia de ontem, a Global Share planeia realizar uma festa de lançamento para o mês de Setembro, ainda sem data e local definidos.


O jornalismo cor-de-rosa é uma nova etapa histórica onde convivem lado-a-lado o sensacionalismo da imprensa amarela, a manipulação da verdade da imprensa marrom e a notícia light, plastificada e marketizada da imprensa cor-de-rosa.

quarta-feira, agosto 16, 2006

World Press Photo 2005

A vencedora:





Mãe e filho num centro de alimentação de urgência, Tahoua, Niger,

1 de Agosto de 2005

Autor: Finbarr O'Reilly, Canada, Reuters

Todas as fotos vencedoras de todas as categorias podem ser vistas no site oficial do World Press Photo.

segunda-feira, agosto 14, 2006

Obrigado por tudo Francisco Louro


O Xico partiu mesmo. Custa acreditar, mas connosco está apenas, e só, a sua memória. Esta jamais se separará de nós, tantos foram os momentos bons, de companheirismo autêntico, que nos proporcionou. A sua bondade, aliada a uma grande disponibilidade para servir a comunidade, a imensa tolerância para com o seu semelhante, o seu desapego aos bens materiais, pondo sempre de parte interesses pessoais em prol do colectivo, foram as razões que levaram a que tantos amigos fizesse ao longo da vida, facto evidenciado na despedida final, no cemitério da Meadela.
Com o Xico fiz uma das grandes amizades da minha vida. Ele costumava dizer que comigo ia ao fim do mundo. Irmanamo-nos por tantas causas, que de muitas delas já nem me recordo. Pode-se com propriedade afirmar que onde estava um também estava o outro. Por essa razão, acompanhei, hora a hora, a luta que travou com a morte, na qual desta vez saiu perdedor, em curtíssimo espaço de tempo. Há que dizer, porém, que soube encarar esta derrota com a mesma coragem com que conseguiu muitas vitórias. “Estou preparado para morrer”, disse, vezes sem contas, quando começou a sentir que o fim podia chegar breve. “Enterrem-me com música e uma salva de palmas”. Exprimia estas palavras com a mesma coragem de que sempre fez alarde ao longo do tempo. E as palmas emocionadas, e intensas, daquela imensa multidão presente para o ver descer à terra não faltaram.Eram palmas de homenagem, mas de raiva, que bem gostaríamos de bater no agradecimento público que, enquanto vivo, lhe devíamos todos ter proporcionado.Obrigado por tudo Francisco Louro.
Será que, como muitos acreditam, nos voltaremos a encontrar, para passar em revista dezenas de anos de combate, e de camaradagem, por quase todas as causas de que a sociedade é portadora?
Então, até qualquer dia Companheiro.

Gonçalo Fagundes

sábado, agosto 12, 2006

Hoje estou triste… morreu o Chico Louro



Ser amigo, é ser para sempre

Morreu um pedaço de mim
Amputaram-me um amigo
Nunca te esquecerei Chico
Ficarás sempre comigo.

Contigo partilhei tudo
Ideias, emoções e amizade
Parte em paz amigo Louro
Já és uma imensa saudade.


...Até sempre amigo.

José Marques
Viana do Castelo

sexta-feira, agosto 11, 2006

Quem resiste a uma bela flor?...


Quem resiste a uma bela flor?...
São tantas na terra espalhadas
Geradas pelo supremo criador
Deviam ser todas amadas...

Formadas com muito amor
Cada uma tem sua beleza
Todas tem o seu valor
No mundo da natureza

Olhamos os lírios dos campos
Vestidos por DEUS com carinho
Nem os reis tem os seus mantos
Assim diz num pergaminho

A elas coube uma boa comparação
Valores iguais no jardim da vida
Uma sofre com o coração
Outra alegra a alma sofrida

Resistir flor e mulher...
É quem não tem sensibilidade
Quem as deseja sempre quer
Não se trata de vaidade...

A flor tem perfume e poesia
A mulher desejo profundo
Dê a elas, amor e cortesia
Em qualquer lugar deste mundo...

O choro das duas estremecem
A terra seca sem orvalho
Bem por isto se parecem
Com elas não tem atalho...

Amemos estas duas riquezas
Muito finas como o cristal
São jóias de tão grande beleza
Não existe nada igual...

O infinito ao clarão do luar
Que também é inspiração
Lembra delas e a todos confessa
Que flor é adorno e mulher é paixão...

Assim, quem as pode desmerecer?
Insensatos de coração...
Jamais as façam sofrer
Nunca as deixe cair no chão.

Gizeldo Baptista de Almeida

quinta-feira, agosto 10, 2006

Jardim convida a investir "onde não há bufos"


Alberto João Jardim apela "aos empresários do Continente que não estejam satisfeitos com aquilo que lá se passa para transferirem o seu domicílio fiscal para a Região Autónoma da Madeira. Aqui nem sequer há bufos", afirmou.

Jardim garante sigilo fiscal, já que, na Madeira, ninguém corre o risco de ver o nome incluído em listas de caloteiros publicadas na comunicação

Isto é a fraude fiscal legalizada que, com a ajuda do Sr. João, que com o seu controlo da instituição regional do sistema tributário e com o paraíso fiscal da Madeira, permite que o polvo do sistema financeiro não pague os mesmo impostos que todas as outras empresas pagam.

Claro que depois quem cobre o défice, são os sempre os mesmos, quem trabalha e paga honradamente os seus impostos

Como é fácil fazer filhos nas mulheres dos outros, Sr. João…

É PRECISO TER LATA!!!

Secretário pessoal do Presidente


O filhote tira um curso superior, tipo "licenciatura em apanhador de borboletas", um curso de 3 anos e de extrema importância para o Supremo Tribunal de Justiça.
O paizinho arranja um tacho, daqui a 6 meses tá nos quadros da função pública e depois vem um ministro a dizer que só nos podemos reformar aos 105 anos porque não há euros...

quarta-feira, agosto 09, 2006

Louvor

Que me perdoe o Sr. Motorista, pois não quero duvidar da sua competência enquanto fiel servidor do estado.
Mas… não há pachorra para tantos dislates dos nossos governantes.

segunda-feira, agosto 07, 2006

S.O.S - Socorro!!!


Eram 3h. da manhã acordei com um incêndio
na minha casa e começou no meu quarto!
Não quis ligar para os bombeiros.
Não tinha mangueira, nem nada!
Tentei apagar o fogo com as mãos.
Demorou cerca de 1 hora.
Estou na fase do rescaldo.
Não consigo dormir!
Tenho medo que volte a reacender!
Ainda não contabilizei os estragos.

Lila Loureiro,
Viana do Castelo

domingo, agosto 06, 2006

RETALHOS - O embarque para a guerra IV (fim)

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A tropa do exército, vinha de vários pontos do País em quantidade suficiente para encher o navio. Desfilava em continência perante as altas esferas militares, com as senhoras do Movimento Nacional Feminino e da Cruz Vermelha a distribuírem lembranças e folhetos sobre o território de destino.
Depois de os mandarem para a guerra ainda tinham que prestar vassalagem aos senhores da guerra que depois da cerimónia, da entrega de mais de um milhar de jovens para a guerra, regressariam sem remorsos para os faustosos sofás dos ministérios do Terreiro do Paço.
Felizmente dessa nos livrámos. Subimos directamente o portaló do navio sendo instalados em 2ª classe, em camarotes, como se fossemos diferentes dos demais militares, tal era o estatuto que uma Tropa Especial da Força Aérea dispunha.
Os soldados do exército, vulgo feijão verde, estavam mal preparados para a guerra pois, pouco mais sabiam do que marchar. Em menos de meio ano, lá estavam os verdadeiros sacrificados pela guerra, como se de animais se tratassem, a serem alojados em beliches armados nos porões negros do navio.
As famílias apinhavam-se nas varandas da gare marítima com lenços a acenar. As despedidas das famílias, o coro dos lamentos gritado por milhares pessoas são momentos muito difíceis de descrever. As lágrimas que derramei, embora disfarçadas, foram de solidariedade para com as mães dos muitos companheiros de viagem. Nenhum familiar meu se foi despedir porque o norte ficava muito longe e a vida difícil não o permitia.
Olhava para os militares pendurados em tudo quanto era sítio a lutar por um lugar no convés, nas baleeiras, ou a trepar aos mastros, para os últimos acenos.
A sirene apitava e, durante alguns anos, a instalação sonora tocava uma marcha intitulada “ANGOLA É NOSSA” independentemente do destino – um ritual abandonado nos anos mais próximos do fim da guerra.
“Carne p’ra Canhão!!!” era esse o sentimento que a marcha militar deixava… a alguns milhares de jovens que não sabiam se regressariam sãos e salvos. Enfim era a dita “guerra do ultramar” que nos esperava.
Por volta do meio-dia, o navio recolhia o portaló e os cabos. Afastava-se lentamente, virava a proa à foz do Tejo, passava por baixo da ponte do ditador, hoje ponte 25 de Abril, e deslizava diante da Torre de Belém. A fome já apertava e eram dadas instruções para a primeira refeição a bordo.
Ainda tenho bem presente o afastamento do navio do cais. Vi a multidão com rostos algo crispados a acenar os lenços e milhares de pessoas com as lágrimas escapando do choro compulsivo.
Já não se avistava o cais, mas ainda se ouvia o gritar lancinante das mães. Esses gritos acompanharam-me durante os nove dias de viagem. Foram terríveis os momentos do despegar do solo pátrio a caminho do desconhecido da guerra. Por mais cerimónias ou levantamento da moral das tropas, sabíamos que nem todos voltariam. Muitos de nós regressariam embrulhados em caixões, outros deixariam por lá as botas decepadas pelas minas, mas todos sabíamos que não mais seríamos os mesmos jovens que agora nos mandavam mar dentro.
Puta de vida esta…

sábado, agosto 05, 2006

RETALHOS - O embarque para a guerra III

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O “Vera Cruz”, antigo paquete de luxo, fez a sua 1ª viagem inaugural ao Rio de Janeiro em 1952. Com lotação esgotada, entre os muitos convidados encontrava-se o Almirante Gago Coutinho. Em 1954, juntamente com seu irmão gémeo, o paquete Santa Maria, iniciou a sua carreira aos portos da América Central. Em qualquer porto que atracava era motivo de interesse. A sua imponência e beleza como navio de linhas elegantes eram motivo de registo. Mantendo as viagens regulares ao continente americano, o Vera Cruz em 1956, realizou um périplo por África de 8 de Agosto a 29 de Setembro. Só em 1959 é que realizou a sua primeira viagem a Angola. Com o início da guerra colonial em Angola, o governo de Salazar, para fazer frente aos acontecimentos, requisitou diversos navios para o transporte de tropas e material de guerra, passando a ser uma das principais ocupações dos navios portugueses. O Vera Cruz não foi excepção. Adaptado para o transporte de tropas, com a instalação de alojamentos nas cobertas, a 5 de Maio de 1961, largou de Lisboa rumo a Luanda tendo no mastro principal hasteada a flâmula verde e encarnada, habitual nos navios de guerra. Em 1962, o Vera Cruz é requisitado para se deslocar ao Paquistão com o fim de recolher os militares feitos prisioneiros, devido à invasão da Índia Portuguesa pelos indianos.
Estava ali imponente atracado no Rio Tejo para mais uma missão que a guerra lhe destinava, embarcar tropas para o ultramar. Seria das últimas viagens que faria, pois em 1972 seria vendido para abate desaparecendo um dos símbolos da Guerra Colonial.
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quinta-feira, agosto 03, 2006

RETALHOS - O embarque para a guerra II

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Na esquina virada para o campo onde os mobilizados regressavam ordeiramente e quase em silêncio, estava, na penumbra, o sargento de dia, qual malvado, qual carniceiro sem dó nem piedade a apontar o caminho do cadafalso. Era com certeza mais um sargento analfabeto, orgulhoso das divisas conquistadas só porque se ofereceu para matar pretos em África, mas desprovido de qualquer sentimento altruísta e falho de humanidade.
De forma cobarde, apontava a cada um o caminho da guilhotina que lhes ia ceifar, pela última vez, o cabelo que estava novamente a começar a crescer.
“- Filho da puta, ainda por cima um nosso conterrâneo” – não se conteve o Afife.
“- É de Viana o gajo pá?”- logo perguntou outro.
Nem respondi com a vergonha, mas todos sabiam que sim.
Naquele momento uma garrafa de cerveja estilhaçou-se na parede a poucos centímetros da cabeça do açougueiro. Sei que voou por cima das nossas cabeças e arremessada bem lá de trás como se de uma granada se tratasse. Nunca se soube quem a atirou, nem tão pouco alguém procurou saber o autor. O clima de irmandade fortalecia-se e o assunto morreu ali para todos, menos para o sargento que, cobardemente, se encolheu e não tossiu nem mugiu. Com isso, beneficiaram aqueles que escaparam da ida ao barbeiro.
Hoje, passado mais de 30 anos, esse sargento que parecia que tinha o rei na barriga com a farda e as sujas divisas, passeia sozinho. Nenhum de nós, e somos bastantes, lhe passa “bife”.
De manhã bem cedo, mais cinquenta e dois pára-quedistas transportados num autocarro da Força Aérea partiram de Tancos até à capital, mais precisamente para o Cais da Rocha de Conde Óbidos, onde nos esperava o navio “Vera Cruz”.
Até 1974, o mar era a grande via de ligação ao império. Mais de 90% da carga e de 80% do pessoal metropolitano empenhado na guerra tinha sido transportado em navios. Os paquetes mais requisitados na ligação a África foram o Vera Cruz, o Niassa, o Lima, o Império e o Uíje. O Niassa foi o primeiro paquete afretado como transporte de tropas e de material de guerra, por Portaria de 4 de Março de 1961, mas seria o Vera Cruz a fazer mais viagens, chegando a realizar 13 num ano. Em 1961, efectuaram-se 19 travessias em nove paquetes em missão militar e o ritmo aumentou à medida que crescia a força expedicionária em África.
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terça-feira, agosto 01, 2006

RETALHOS - O embarque para a guerra


Todos tínhamos já como companhia a “guia de marcha” para Angola. Sabíamos que dali a uns dias estaríamos, do outro lado do mar, precisamente onde 10 anos antes tinha rebentado a guerra. Esta viria a conduzir à libertação desastrosa de uma das últimas colónias em África.
Nessa noite, nada nos restava, senão despedirmo-nos de nós próprios, com o corpo a despegar-se da alma, pois os dez dias de licença de mobilização já estavam gozados, as despedidas da família e os abraços dos amigos já estavam consumados e até dos braços da namorada já nos tínhamos separado. Era como se o cérebro se diluísse e se separassem os neurónios, fica-se um destroço humano. Este desunir o corpo da alma cria em nós uma tristeza travestida de alegria pela acção das dezenas de cervejas que se emborcam tingindo o espírito de cada soldado.
Nada nem ninguém conseguiria tingir por muitas horas este apocalipse que se apoderava de nós, onde o álcool só conseguia preservar por algumas horas este estado de falsa alegria que nos levava a coisas impensáveis.
Como a querer prolongar os santos populares, engalanaram-se as camaratas, de cama a cama, como rolos de papel higiénico áspero em consonância com o que fizeram de nós. Muitos, já bem bebidos, a incomodar os soldados que por cá ficavam a ultimar a sua preparação militar. Algumas escaramuças foram inevitáveis e as cervejas que nos acompanhavam tiravam-nos o discernimento e o bom senso. Os soldados precisavam de descansar porque para eles o dia seguinte, era mais uma preparação dura e infernal que os esperava e não se compadecia com os sinistros festejos dos mobilizados.
Já a madrugada ia alta e ainda se viam espalhados pelo campo de futebol que ficava quase paredes-meias com a camarata, muitos corpos vomitados, outros tantos sonolentos a acordar para a vida novamente. O efeito de uma falsa alegria que lhes tingia a tristeza, passava rapidamente e como cordeirinhos regressavam às suas casernas para tentar dormir um pouco antes do despontar do dia. O corpo casava-se de novo com a alma e o discernimento voltava lentamente.
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domingo, julho 30, 2006

A cultura do ódio - parte dois

Eu também estive numa guerra, mas felizmente não vi nem pactuei com atrocidades vergonhosas como a que estamos assistindo e entrando pelas nossas casas dentro sem pedir licença. Sei que é outro tempo e outro tipo de guerra, mas a guerra é sempre uma guerra seja em que ponto se situe.
Se somos ex-combatentes de uma guerra que durou 13 anos e que infelizmente ainda se prolongou muito mais tempo essa guerra fratricida entre irmãos da mesma cor e solo pátrio.
Essa memória que o tempo não apagou devia-nos servir para em nome disso apelarmos ao bom senso e ao fim da guerra.
Dizer que quem quer a paz tem que fazer a guerra, já só faz sentido no espírito belicista dos americanos e seus afins, de forma a alimentar uma industria de guerra que não olha a nada e que tem que inventar sempre uma guerra, mas bem longe, para que não sofram os seus efeitos.
Não é educar as crianças desse modo, e nem um lado (árabes) nem o outro (judeus) estão isentos.
É a cultura do ódio, que deu título a este post, e eu como ex-militar e ex-membro de uma força de elite que combateu na guerra de África, recuso-me alinhar nem por um lado nem pelo outro, o meu lado é o dos inocentes civis, de ambos os lados. Das crianças, das mulheres e dos velhos, pois são esses sempre que pagam a factura mais alta.
A solução é tão simples: basta pôr em execução as inúmeras Resoluções da Assembleia e do Conselho de Segurança da ONU sobre a questão palestino-israelense. Nunca foram colocadas em execução porque os Estados Unidos decidiram que a ONU não apita na região, quando o assunto envolve Israel. Lá a ONU só serve para dar cobertura a invasão de países árabes, como o Iraque.
Segundo O secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan, a autoridade e a razão de ser do Conselho de Segurança estão postas em causa. As pessoas perceberam o seu fracasso nesta crise, não conseguindo actuar rápida e eficazmente e tudo isto, acrescento eu, porque os americanos são do contra, esta guerra interessa-lhes.
NÃO Á GUERRA

sábado, julho 29, 2006

A cultura do ódio

Não existem palavras que exprimam a minha indignação e revolta pela barbárie israelita, que os "média" só muito parcialmente referem. Por isso, coloco aqui a ligação para quem estiver interessado em constatar a que níveis pode descer o ser humano.
Nota importante: Não é aconselhável a pessoas sensíveis

Crianças israelitas escrevem mensagens nas bombas que hão-de matar outras crianças ( Foto extraída de: http://resistir.info/)

Surripiada com a devida vénia de: Blogue de Pedra (Obrigado João)

sexta-feira, julho 28, 2006

INFÂNCIAS PERDIDAS!!!!!!!


O que dizer daquelas crianças que "perderam direitos adquiridos", pelo nascimento de um irmão mais novo?
É do conhecimento geral que há crianças
que, embora permaneçam no seio familiar,vêem reduzido o afecto, a atenção, e todos os cuidados até então recebidos serem transferidos para um irmão mais novo.
Por outro lado, sabemos que há crianças que foram obrigadas a crescer rapidamente para cuidar dos irmãos mais novos, ou seja, não tiveram
nem viveram a sua própria infância.

O que dizer acerca daquelas crianças,
às quais lhes foi negada a permanência
no seio familiar, após o nascimentos de um irmão mais novo, e de outro, e de outro.
Nestes casos, costuma-se camuflar a realidade com a falta de espaço,com a falta de tempo...Trata-se de situações menos comuns, mas muito graves em que a criança é brutalmente rejeitada, retirada do seu próprio lar, dos braços da mãe, para viver com um outro familiar.

Para os adultos resolveu-se um problema,
da forma mais cómoda, mais egoista.
Para a criança,que se vê rejeitada pela própria família , criou-se um problema
que a irá acompanhar pela vida fora.

Como é que estas crianças podem amar os próprios irmãos mais novos, que foram a causa directa do seu afastamento?
Como é que estas crianças vêem os
seu pais, principais autores da sua descriminação?

Trata-se de crianças educadas e acarinhadas por um familiar disponível, em geral sem filhos , que nunca conheceu os segredos e a magia da maternidade.
Estas crianças não recebem o afecto dos pais e ficam privados do convívio com os irmãos.
Brincam sozinhos.
Não dividem alegrias, nem tristezas.
Crescem sem conhecer a alegria da partilha.
Habituam-se a ser auto-suficientes,
e ao mesmo tempo egoistas.
Não conhecem o sentido da
generosidade.
Contam só com eles próprios!

Como será a relação irmão/irmão?
Como será a relação mãe/filho?
Como será a relação com outras crianças?
Como virá a ser a relação com os adultos?
E com a sociedade?

Claro que estas situações acontecem,
por egoismo dos adultos, que, impunemente, "despacham" o filho mais velho ,ficando, deste modo, mais libertos e disponíveis para se dedicarem aos
filhos mais novos.

Como é que crianças mal amadas, mal acarinhadas, podem, mais tarde, serem adultos emocionalmente equilibrados?
Como é que crianças que viram fugir o seu direito a serem acarinhadas pelos
próprios pais, podem, um dia, ser adultos carinhosos?

Estas separações forçadas poderão provocar danos irreversíveis e irreparáveis,
que se poderão estender pela vida fora...
Apesar disso, e, impunemente,estas situações continuam a acontecer.

Os sinais de revolta são evidentes:
Filhos que não se identificam com os pais.
Irmãos que não se reconhecem.
Famílias desagregadas, onde não existem elos de afectividade, nem outro tipo de ligação.

Então, temos adultos que não sabem amar...
que não conseguem acarinhar!
Temos adultos a dar exageradamente
o que nunca tiveram...
Temos adultos a não dar, porque nunca receberam...
Temos pais que nunca foram crianças...
Provavelmente, nunca saberão ser pais!!

Lila Loureiro,
Viana do Castelo

sexta-feira, julho 21, 2006

Sala de fumadores

Decoração exclusiva para o tecto


quinta-feira, julho 20, 2006

RETALHOS - O povo não queria guerra (fim)

Desde puto, era ali no rio, a dois passos de casa, que ia apanhar caranguejos com uma corda, uma pedra e as entranhas do peixe pedidas às peixeiras do mercado. Precisamente no local onde viria a surgiu o pior atentado urbanístico vianense, um prédio de 12 andares. Hoje toda a população quer vê-lo em baixo para exemplo dos vindouros.
Queria transportar, na minha memória as mimosas do monte de Santa Luzia. Vale a pena subir ao topo do Monte de Santa Luzia (a cerca de três quilómetros do centro da cidade), a pé, de funicular ou de carro. Dele se desfruta uma das panorâmicas mais sublimes do planeta sobre a cidade, o rio e o mar. A cidade com as ruas e vielas sinuosas, largos e praças pitorescas, as suas muitas casas senhoriais e palacetes recordando a importância que adquiriu no século XV como porto de pesca e terra de onde saíram navios, marinheiros e navegadores para os grandes Descobrimentos portugueses do século XVI, iriam também comigo.
A Nossa Senhora da Agonia, celebrada em Agosto, atraindo multidões para assistirem à procissão, com o desfile das mulheres envergando os seus magníficos trajes típicos, os arraiais com muita música, bailes e fogo de artifício, além da tradicional bênção dos barcos de pesca seriam recordações que me acompanhariam sempre.
Já o poeta vianense, Pedro Homem de Melo, lia como quem canta este tema que Amália imortalizou:


Se o meu sangue não me engana
como engana a fantasia
havemos de ir a Viana
ó meu amor de algum dia
ó meu amor de algum dia
havemos de ir a Viana
se o meu sangue não me engana
havemos de ir a Viana.


Levei de tudo isto um pouco, para além dos abraços dos amigos, da paixão da namorada e do amor de minha mãe.
Em meados de Junho de 1971, só a Jorgelina, uma das minhas irmãs, acompanhou-me à estação dos caminhos-de-ferro. Depois de uma despedida com dor e já com muitas saudades, com o comboio a entrar na ponte metálica sobre o rio, dei comigo, com os olhos vidrados, a fixar o lado esquerdo da linha férrea, Queria ver, mais uma vez, a minha casa que ficava ali a algumas dezenas de metros.
É muito doloroso, uma mãe ver um filho partir para a guerra. E ali estava ela sozinha, vestida de preto, acenando-me o último adeus até onde a vista o permitia. Por fim, deitou ambas as mãos à cabeça, numa atitude de desespero, por ver partir alguém que ela brotou e criou e que agora via a guerra levar. Pela primeira vez uma lágrima correu teimosamente no meu rosto. Acenei com a alma tolhida. Levei comigo essa imagem que me acompanhou sempre na guerra e para além dela.

terça-feira, julho 18, 2006

RETALHOS - O povo não queria guerra II

Regressámos à casa mãe, era assim que era denominado o Regimento de Caçadores Pára-quedistas. Ao fim de alguns dias é publicada mais uma lista de mobilização. Recebi a esperada notícia com tranquilidade onde cerca de duzentos militares foram divididos pelos 3 teatros de guerra em África. Ao pessoal do meu curso, que se tinha safo da primeira leva, tocava-lhes, agora, Angola. Ainda não era desta que dois amigos embarcariam: o Martins “o algarvio” porque estava a tirar a especialidade de tratador de cães de guerra, mas no fim do curso dificilmente escaparia e o Covilhã, que mercê da sua extraordinária força e destreza, sendo considerado o melhor soldado do curso nas provas físicas, ficaria na metrópole adstrito à área da educação física e desportiva.
A mobilização esperada desta vez também foi comigo… foi-me concedida uma licença de dez dias, de forma a poder estar junto dos meus, pois a ordem de embarque poderia surgir a cada momento. A única coisa que sabia era que ia para Angola, de avião ou de barco, mas o destino estava traçado.
Não foram férias esses dez dias concedidos, mas sim um tempo de despedida de tudo o que me prendia e do que queria levar comigo e não era só a família, os amigos e a namorada. Queria levar a essência da minha cidade e das águas do Rio Lima. Este com uma longa história profundamente interligada a uma velha lenda, sobre as suas margens. Na altura do Império Romano era conhecido por "Rio do Esquecimento", pois os soldados sabiam que quem atravessasse as suas margens perderia "o olvido do passado e da própria pátria", tal como refere o Conde de Bertiandos, in Lendas. Assim sendo, as legiões romanas temiam as águas do Lima e negavam-se a navegar sobre elas. Apenas no ano de 135 a.C. as tropas romanas atingiram a margem esquerda do Lima, comandadas por Décios Junos Brutos, que, empunhando o estandarte das águias de Roma, desafiou a "beleza manhosa" das águas do rio e as atravessou sozinho. Já do outro lado da margem, o comandante chamou cada soldado pelo seu nome, conseguindo assim provar às suas tropas que, apesar do fascínio do rio Lima fazer lembrar o rio Lethes, apagando a memória a quem o atravessasse, a lenda não era verdadeira. Ainda hoje, quem conhece este rio e sabe a "história" das suas margens não se cansa de enaltecer a velha lenda popular.

segunda-feira, julho 17, 2006

RETALHOS - O povo não queria guerra

Com mais uma fornada pronta, de Caçadores Pára-quedistas, era o sinal de que estava iminente mais um embarque para África.
Maio corria velozmente para o fim e eu era rendido na Polícia Aérea sendo colocado de novo em Tancos. Aqui reencontrei camaradas do meu curso que só aguardavam sinal verde, tal como eu, para embarcar junto desta última fornada e, desta vez, falava-se que seria para Angola.
O Golpe de 28 de Maio de 1926, foi um pronunciamento militar que pôs termo à Primeira República, levando à implantação da auto-denominada Ditadura Nacional, depois transformada, após a aprovação da Constituição de 1933, em Estado Novo, regime que se manteve no poder em Portugal até à Revolução dos Cravos de 25 de Abril de 1974. O Golpe de 28 de Maio começou em Braga, comandado pelo general Gomes da Costa, seguida de imediato em outras cidades como Porto, Lisboa, Évora, Coimbra e Santarém.
Em 1971, 45 anos depois, estávamos desfilando em Braga, cidade que conta com mais de 2.250 anos nos Anais da História e uma das cidades cristãs mais antigas. É, ainda, considerada como o maior centro de estudos religiosos em Portugal e pode, realmente, estar muito orgulhosa do seu título de "Cidade dos Arcebispos". O povo veio à rua aclamar os seus soldados que iam subindo a Avenida da Liberdade. As pessoas apinhavam-se nos passeios, vibravam num misto de aplausos e de emoções, as pétalas de flor arremessadas das janelas voavam como se de pequenos pára-quedas se tratassem. O marchar característico dos Pára-quedistas e o som das botas em uníssono, ecoava ao longo do percurso.
Foi de facto fantástica a recepção que nos esperava no Campo da Vinha, onde as tropas chegavam e alinhavam em formação com os seus estandartes. As casas engalanadas com as suas varandas e janelas polvilhadas de colchas e bandeiras, davam um ar festivo e um acolhimento aos bravos soldados que em breve partiriam para a guerra.
O povo anónimo e as suas famílias vitoriavam a bandeira e os seus soldados. O povo não queria guerra. O povo sabia que esta parada militar era uma antecâmara da guerra e que muitos dos que agora vitoriavam, não voltariam tombando no capim ensanguentado. E o regime apropriava-se indevidamente destes sentimentos.

sexta-feira, julho 14, 2006

A pressão política sobre o poder judicial (… vista do nosso quintal)

(da caixa do meu correio)

A Itália é campeã do Mundo e bem o merece. São campeões do Mundo em tudo. Em futebol, em malandros do futebol, em polícias do futebol, em justiça do futebol. Em nenhuma destas especialidades são ultrapassados.
Dentro das quatro linhas são impecáveis no seu jogo cínico e eficaz. Fora das quatro linhas, o futebol italiano depura-se periodicamente e renasce mais forte.
Em Itália, a última depuração coincidiu com o último título mundial. Estão duas vezes de parabéns.
Mudando de assunto:
Em Portugal, segundo uma notícia do Público, a Assembleia da República, baluarte do Estado democrático, convidou o presidente do FC Porto para um jantar dentro do espaço do Parlamento. De acordo com as declarações da deputada socialista Rosa Albernaz trata-se de «um jantar-convívio», de «uma iniciativa que já vem de há muitos anos, já foi feito com o Benfica e com o Sporting».
Quando a deputada diz que «já vem de há muitos anos», presume-se que queira dizer que já tinha acontecido antes de existir na justiça portuguesa o processo de corrupção denominado Apito Dourado. É uma suposição, claro está.
«Assim como se convidam autarcas de dirigentes de associações, convidamos também o senhor Pinto da Costa», esmiuçou a deputada socialista, ou seja, do partido que nesta altura do campeonato forma o Governo.
A notícia terminava em beleza: «Pinto da Costa será recebido antes do jantar pelo presidente da Assembleia da República, Jaime Gama.» Ora Jaime Gama nem vai muito em futebóis. Não gosta e está no seu direito. Ou será que já gosta? Também está no seu direito.
Mudando drasticamente de assunto:
Pinto da Costa é um dos envolvidos do processo Apito Dourado. As acusações sobre o presidente do FC Porto são tudo menos lisonjeiras.
As transcrições de conversas telefónicas que o envolvem podem não ser válidas para o Ministério Público mas são válidas para a opinião pública, para o mais comum dos cidadãos. Esses mesmos cidadãos, um a um, que elegem os deputados da Assembleia da República.
Mudando completamente de assunto:
A Assembleia da República é, portanto, um lugar respeitável. Não pode ser um terreiro de comícios contra o curso da justiça, como já foi, infelizmente, por ocasião de um outro processo judicial, o da pedofilia.
Uma viragem de 180 graus no assunto:
«A Federação Portuguesa de Futebol também podia aplicar sanções, como em Itália, aos clubes apanhados nas escutas do Apito Dourado. Não há nada que o proíba, nem sequer que impeça que algumas das matérias já arquivadas no âmbito criminal possam ser sujeitas a sanções desportivas no âmbito disciplinar. "O que acontece no nosso país é um problema de mentalidades. Todos acham que uma actividade só é ilícita se for penalmente criminalizada", diz ao Público, António Cluny, procurador-geral adjunto.»

Por acaso também já tinha pensado nisto.
Um assunto diferente:
Jantarão bem os deputados com o presidente do FC Porto?
Ainda haveremos de chegar ao ponto de ouvir dizer que os deputados, com a ironia do costume, votaram a lei tal e tal…
Uma ideia completamente disparatada, atendendo ao país:
A pressão do poder político sobre o poder judicial é o maior flagelo das sociedades ocidentais, democráticas e asseadas.
Por muito inocente, folclórico e exclusivamente gastronómico que seja o jantar na Assembleia da República oferecido ao presidente do FC Porto, num momento em que há um processo a correr — mesmo sabendo todos, como suspeitamos, que vai prescrever e ser arquivado — estamos perante um caso lamentável de mais do que aparente pressão do poder político sobre o poder judicial.
Democratas, ocidentais, asseados… depois queixem-se.
Na próxima quinta-feira, nesta página, prometo aos leitores uma reportagem detalhada ao pormenor do jantar oferecido pela Assembleia da República ao presidente do FC Porto. Foram instalados vários microfones nos cestinhos de pão e poderemos, assim, todos desfrutar dos diálogos, graças e trocas de confidências entre os convivas. Se tiver paciência, vou traduzir para italiano as transcrições das gravações. A ver se a coisa fica mais divertida.

A.P


sexta-feira, junho 30, 2006

RETALHOS - A sabotagem (fim)

“ – Aguarde uns minutos, pode ser que tenhamos sorte com o próximo.”
E naqueles dois ou três minutos de espera ainda dentro do táxi, confessou-me que também tinha um filho em Angola, que entendia muito bem a vida de um militar e que me ia ajudar esperando o tempo que fosse necessário.
Era muito raro, uma família não ter nenhum dos seus membros no ultramar e nas agruras da guerra.
Por sorte a sentinela que entrara agora de serviço, era da minha camarata. Este sabia que eu estava ausente sem autorização, mas percebia as razões pois tinha sido um dos que me dissera para aproveitar estes meses nas calmas. Fez-me sinal para entrar e ao passar por ele, quase em surdina me avisou:
“ – Nosso Pára, vá de imediato guardar o saco pois vai haver mais uma chamada para confirmar as presenças”.
“ – Obrigado nosso cabo, Deus lhe pague” – manifestei logo ali o meu sincero agradecimento.
“ – Não perca tempo e não se preocupe porque não está em falta, o seu amigo alentejano ontem respondeu por si.”
Claro que fui dar um abraço sentido ao, muito recente, amigo alentejano que demonstrou a todos o valor da amizade. Com um gesto mostrou que vale a pena sentir a felicidade de poder contar incondicionalmente com alguém. Soube estar presente, adivinhando a minha dificuldade e fazendo da amizade um ponto positivo na vida.

RETALHOS - A sabotagem (V)

Ao fim de quatrocentos quilómetros e de nove horas intermináveis, desembarco na estação de Santa Apolónia em Lisboa, por volta das sete da manhã. O dia estava bonito, o sol a despontar e uma pequena brisa trazia a maresia salpicada com o bafo do Tejo ali mesmo ao lado.
Com as pessoas ainda ensonadas e taciturnas, Lisboa já começa a formigar. Os comboios descarregavam os passageiros nas estações. Os barcos, que antes tinha ajudado a construir nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, vindos da outra margem desaguavam no cais. As camionetas despejavam os seus utentes no Campo das Cebolas. O Metro e os Autocarros transportavam esse formigueiro de pessoas para os seus empregos.
Uma vez chegado, meto-me num táxi e digo ao taxista:
“ – Para Monsanto por favor, para a Policia Aérea.”
Ainda à civil rumo á Serra de Monsanto de forma a tentar entrar sem dar nas vistas no quartel. Pelo caminho vou conversando com o chauffeur, dando-lhe conta da minha situação e tentando ganhá-lo. Fui mudando de roupa pelo caminho e na subida para Monsanto, numa zona mais arborizada e deserta, comecei a mudar de calças. O homem do táxi, com cara de gozo, diz-me:
“ – Ó pára-quedista, mude de calças rápido pois se alguém o avistar de calças na mão, ainda passamos por paneleiros” – mesmo troçando da situação, o homem tinha razão, dois homens em Monsanto e um a mudar de roupa…
Completei a muda, fiquei de farda azul vestida e de boina verde. Eram quase oito horas da manhã e ainda de dentro do táxi vi quem estava de sentinela à porta de armas, e para mal dos meus pecados, não me era familiar o sentinela.
Como estava na hora de mudança das sentinelas, foi o bom do taxista, que se tornou meu cúmplice e me disse:

RETALHOS - A sabotagem (IV)



A notícia colheu meio mundo de surpresa. A BA3 era o maior complexo militar da Força Aérea sendo uma base de aviação de ligação, transporte e treino de tropas pára-quedistas, para além de ser uma unidade também de treino dos pilotos para a guerra colonial.
Fora ali desencadeada pela ARA (Acção Revolucionária Armada) uma acção com vinte cargas explosivas e incendiárias em vinte aviões e helicópteros. Para afrontar o regime e logo num santuário militar por excelência, infringindo pesadas baixas materiais em aviões de guerra bastaram três homens: um cabo miliciano, militar no activo precisamente na base de Tancos e quase a completar o curso de piloto de helicópteros dado por instrutores franceses; um ex-furriel enfermeiro militar com a especialidade de neuro-psiquiatria, com quase três anos de serviço em Moçambique donde tinha regressado em Março de 1969 e onde assistiu, impotente, às mortes e às vidas estropiadas por feri­mentos sem remédio de muitos combatentes involuntários; e o mais velho, 28 anos de idade, que também esteve na acção do Cunene, tendo sido soldado de uma companhia de caçadores conheceu em Angola, Ambriz e Lundas.
Às dez menos dez da noite, já estava na estação de comboios a comprar um bilhete, mas sem utilizar o “privilégio” de ser militar. Pagava mais caro, mas desta vez ia vestido à civil por ser mais seguro. Embarquei, não se via um militar fardado no comboio, por ser um dia de semana. Passei a noite de terça para quarta-feira, de 9 de Março de 1971, – precisamente no dia de aniversário de minha mãe deixando-a mais uma vez aflita – dentro de um comboio, mas desta vez não ia encafuado como em tantas outras viagens de fim-de-semana. Havia lugares sentados e desta vez, sentia-me mais cidadão, com mais direitos e olhado de forma diferente pelas pessoas.

RETALHOS - A sabotagem (III)

“- Zé, venha cá depressa” – meio assustado e meio atónito pela forma como ela me chamou, pensei logo que íamos ter chatice.
A primeira frase que me veio à cabeça foi: “calma se’Maria, eu quando vier da guerra caso com a sua filha”.
“- Olhe e veja esta notícia na televisão, parece que há problemas na Força Aérea” – respirei de alívio, afinal, não era por causa da filha, nem pelos nossos devaneios.
Apesar deste alívio momentâneo, fiquei bloqueado não conseguindo entender muito bem o que se passava nem ouvir o que ela dizia e perguntei-lhe:
“ – Diga lá o que se passa, não consegui perceber o que aconteceu” – ela olhou-me com cara de mulher avisada, mostrando-me uma cara que não sendo de tolerância, também não era de recriminação e disse:
“- Espere que vai dar outra vez a notícia, mas parece-me que é coisa grave” – enquanto olhava para a filha, mirando-a e recriminando-a com um olhar penetrante, abanando ligeiramente a cabeça, deixando-a completamente gelada.
Comecei a ficar tenso, pois as notícias sobre a Força Aérea eram graves e eu era um militar no activo, mas “desenfiado” em casa. Foram segundos intermináveis que me deixaram bastante nervoso, até começar o telejornal da RTP do estado: SABOTAGEM NA BASE AÉREA Nº 3 DE TANCOS era a notícia de abertura.
“ – Ai minha Nossa Senhora D’Aparecida!” – dizia a velhota.
Dei um beijo à minha namorada, pela primeira vez em frente da futura sogra, e disse-lhes:
“- Não há-de ser nada, mas eu vou ter que ir já embora. O meu quartel, como era de esperar, também entrou de prevenção e eu estou aqui desenfiado.”

RETALHOS - A sabotagem (II)

Enquanto isso, nos Estados Unidos, meio milhão de pessoas marchava contra a Guerra do Vietname em Washington. Uma guerra injusta, em que os USA se envolveram no conflito a pretexto de um ataque norte-vietnamita aos seus navios USS Maddox e USS C.Turney Joy que patrulhavam o golfo de Tonquim, em Julho de 1964. Hoje, sabe-se que o ataque foi uma farsa do governo estado-unidense para ter um pretexto de intervir no Vietname. O Povo levantou-se contra uma guerra em que os vietnamitas tiveram de suportar baixas e bombardeamentos terríveis. Entre os militares americanos, 57 939 perderam as suas vidas.
Hoje, sabe-se também que, na guerra em África, Portugal apenas com 10 milhões de habitantes onde entre os anos 60 e 74 emigrou um milhão e meio de portugueses, fez um esforço cerca de nove vezes superior ao dos EUA, no Vietname, que possui 250 milhões de habitantes. Portugal mobilizou para a guerra do ultramar mais de 800 mil jovens, teve 8 mil mortos, 112 205 feridos e doentes, 4 mil deficientes físicos e estima-se que haja cerca de 100 mil doentes de stress de guerra. À defesa era destinado 40 % do Orçamento de Estado.
O mundo acordava. Os povos dos países fazedores de guerras e que tinham liberdade… protestavam contra todos os Vietnam’s, outros levantavam-se em armas e tudo faziam para alertar consciências, minando e sabotando os regimes.
Perante este cenário de guerra, eu, como tantos outros, sabia o que nos esperava. O grupo dos quatro tentou passar o tempinho que restava junto da família, das namoradas e dos amigos.
No fim de tarde, de 8 de Março de 1971, no átrio junto à soleira da casa da minha namorada, com a sogra debaixo de olho, estava eu namorando e gozando um pouco tentando afogar os desejos e os prazeres de dois jovens. Nestas alturas, as namoradas eram mais permissivas sabendo que ao contrário do slogan da época balnear “há mar e mar, há ir e voltar” o lema era: “há mar e ultramar, há ir e será que há voltar?”. Mesmo com a sogra do outro lado da porta entreaberta velando ou fazendo que o fazia, já o fogo nos consumia, levando-nos onde o amor, a paixão e o desejo podia levar. Não havia muitas formas de apagar o incêndio senão fundindo os corpos. Estávamos nós já na fase de rescaldo e sem ainda ter avaliado os estragos quando a sogra Maria, que não era Maria, me chamou quase gritando:

RETALHOS - A sabotagem (I)

Como era o mais antigo, decidi entrar logo de serviço ou de prevenção vinte e quatro horas por dia, naquela semana. Se não houvesse embarques para África o trabalho era quase nulo ou rotineiro. Os focos de problemas só surgiam ao fim-de-semana e as saídas de ronda pela capital eram normalmente tidas como efeito dissuasor.
O facto de sermos uma Policial Militar em tempo de guerra, permitia-nos, quando em serviço, ter acesso a todos os locais públicos sem qualquer tipo de impedimento ou constrangimento.
Assim, pela primeira vez e até hoje a única, fui assistir a uma sessão de stripteaser, no Hotel Ritz que ficava ali sobranceiro à rotunda do Marques de Pombal. Para mim era uma autêntica novidade. Apesar de não ser oriundo de uma aldeia dos confins da serra, a minha cidade, ainda hoje pacata, não era dada a essas modernices de então, sendo coisas só da capital e das grandes cidades. Não nego que algo em mim acelerou quando as luzes baixaram e se ouviu a música acompanhada da actuação de uma das mulheres, onde todos os olhares se concentraram. A mulher entrou com um cigarro aceso entre os dedos, caminhando docemente para captar a atenção dos espectadores. O seu dançar sensual, o despir atrevido, o seu corpo mantido em forma, sem sacrifício, mostravam uma mulher normal, não muito bonita, mas muito feminina. Era capaz de provocar muitas sensações ao bambolear as ancas, ao roçar-se no poste ou ao deitar-se lânguida no chão e a abrir as pernas... Imaginei que ela se aproximava da minha cara e sentia o seu cheiro, como ela o fez, durante a actuação, junto de caras desconhecidas. A avaliar pelas suas expressões cheiraria bem a vulva e saberia melhor, a avaliar pelo aspecto de alguns. A dançarina sabe o que vale, sabe o que provoca, mas não dá a quem quer.
Aqui não se podia “despir” a farda, nem sequer mostrar as emoções. Éramos quatro militares, fingindo ser assexuados, que se passeavam por detrás da plateia, simulando espreitar alguém fardado por perto. Era um olho no pau, outro no cigano.

quarta-feira, junho 28, 2006

A velha Ponte Eiffel de Viana do Castelo

Os carros podem não voltar a circular na velha Ponte Eiffel de Viana do Castelo. Fonte do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) disse ao Correio da Manhã que os problemas detectados recentemente em dois dos pilares podem levar ao encerramento definitivo da ponte, incluindo o tabuleiro ferroviário.


Já foi informado o Ministério das Obras Públicas acerca dos graves problemas de segurança que afectam a velha ponte metálica, projectada pelo engenheiro francês Gustave Eiffel e inaugurada faz na próxima sexta-feira 128 anos
Além da corrosão das vigas principais, que obrigou à realização das obras iniciadas em Janeiro e à análise de toda a estrutura do tabuleiro (que ontem começou), há dois pilares em risco de colapso, ao que tudo indica devido à extracção, muitas vezes ilegal, de inertes no rio Lima e que pode obrigar ao fecho da ponte à circulação de comboios.
O assunto vai ser debatido na próxima segunda-feira, em que vão participar o governador civil, o presidente da Câmara e o secretário de Estado das Obras Públicas.
Nessa reunião, Paulo Campos deve fazer um ponto de situação acerca do real estado da ponte e, no caso de a solução passar pelo seu encerramento definitivo a carros e comboios, dar nota de soluções alternativas.
Se a ponte não tiver remédio, é natural que o Governo não avance com a construção de uma nova travessia antes da conclusão dos estudos relacionados com o futuro TGV, entre o Porto e Vigo.A Comissão de Utentes da Ponte Eiffel acusa o Estado de “negligência grosseira” e ontem, em conferência de imprensa, anunciou que “se os trabalhos não terminarem a 31 de Julho, como o previsto, entra em Tribunal uma queixa contra o Estado”.
A Comissão de Utentes mostra-se revoltada com os atrasos nas obras e, sublinha o seu presidente, Arménio Belo, que “há mais de seis anos que foram dados os primeiros alertas de degradação da ponte e, por negligência, nada foi feito”.

Grávidas em Badajoz


"para todos os efeitos, a ida das grávidas para Badajoz é um acto voluntário. Não são obrigadas a escolher esse hospital "

sábado, junho 24, 2006

RETALHOS - O princípio do fim III (fim)

Naquela primeira semana, saí para a rua com mais 4 PA’s. Utilizávamos um unimogue que mais parecia uma pandeireta, dando sinais sempre que o condutor se deliciava a fazer perícias. Dar uma cambalhota e projectar-me, não para casa desenfiado, mas para a enfermaria com o chassis feito num oito, era sempre o mais provável.
Onde houvesse cheiro a militares da força aérea, lá estávamos nós para manter e impor a ordem, como se de um embarque, de militares para África, se tratasse.
Na segunda saída, calhou-me logo acompanhar um embarque no aeroporto. Tratava-se do pessoal da minha companhia que comigo andara, sofrera e vencera em Tancos.
“Nosso Pára, não dê confiança aos militares. Lembre-se que a você compete-lhe manter a ordem e a lei” – atalhou o comandante da ronda, um furriel todo emproado.
Mas qual quê, os camaradas de tantas privações passadas, mal me viram com o braçal da Policia Aérea, arrancaram-me da minha pose policial. Vi-me envolvido no meio deles confraternizando e dando a cada um, um abraço de despedida. Só lhes faltou, para desespero dos restantes PA, lançaram-me ao ar em tremenda gritaria. Ainda bem que imperou o bom senso. Ri, bebi, chorei e até embarquei com eles, pois o meu coração e um pedaço de mim, também iam para a Guiné.
Quando os vi na placa de embarque, a decisão ficou tomada: iria para casa sim senhor, mal me pudesse escapar desenfiar-me-ia. Que me poderia acontecer de fosse apanhado? Algum castigo era superior ao destes meus amigos que agora partiam? Sabia que nem todos iriam regressar e muitos dos que voltassem viriam com problemas de vária ordem na mente e nos ossos. Sabendo que militar é sinónimo de desenrascar, assim que chegasse ao alto de Monsanto, iria acertar isto com os meus camaradas: três de nós, iriam de férias

quarta-feira, junho 21, 2006

RETALHOS - O princípio do fim II


Aproximaram-se os novos colegas da polícia e militares da Força Aérea, e um deles ajudou à missa dizendo:
“ – Nosso Pára, aproveitem. Já os outros que cá estavam faziam o mesmo. Esta tropa é para se fazer nas calmas… enquanto cá estão aproveitem.”
O Araújo, sujeito aparentemente bonacheirão, mas vivaço e sempre pronto a tirar proveito das situações, atirou logo de rajada:
“ – Tendes medo? Eu para a semana fico já em casa e que se foda a tropa.” – tentando tirar vantagem do facto de ficarmos surpresos com esta benesse que não lembrava ao diabo.
Eu tinha o exemplo do meu mano mais velho, que num quartel do exército em Sacavém, volta e meia, se desenfiava com a maior impunidade. Só agora, compreendia realmente como estas tropas, em África, eram presa fácil e o termo “carne para canhão” se aplicava com toda a propriedade.
Lembrei-me logo dos relatos feitos por aqueles que regressavam da guerra. Diziam eles, que mal uma companhia do exército era colocada no seu aquartelamento, era certo e sabido que nos primeiros dias os “turras” caíam-lhes em cima, flagelando-os sem piedade.
“ – Ó Afife, tem calma. Esta merda, não é à medida do freguês” – disse eu dirigindo-me ao Araújo. Era assim que eu o tratava por ser de Afife, terra do poeta Pedro Homem de Melo.
“ - O Furriel disse o que disse, mas nós não vamos pelo diz que disse. Se a velhice é um posto… eu sou o mais velho. Portanto, tem calma, temos toda a semana para pensar e não nos vamos meter em alhadas”.
Aquela cara de menino bonacheirão, virou, como por encanto, cara de menino amuado a quem lhe foi sacado o “brinquedo”. Esquecendo-se que o brinquedo, num instante, se poderia transformar, se algo corresse mal, num mandato para a “casa da rata” - assim era denominada, entres os militares, a prisão.
É evidente que aquela proposta me ficou a martelar nos ouvidos e pensando bem, não era de desperdiçar. Já bastava desperdiçar os meus melhores anos e arrancarem-me da minha cidade pacata - Viana do Castelo. Aqui, o mar combina na perfeição com a montanha. O estuário do rio Lima, outrora o rio do esquecimento, é de uma beleza única vagueando aos pés de Santa Luzia. As duas margens são ligadas por uma ponte metálica obra de Gustav Eiffel - o criador da torre Eiffel em Paris - que em Viana do Castelo também deixou a sua marca.

sábado, junho 17, 2006

RETALHOS - O princípio do fim I

Ao fim de oito meses de instrução e preparação, para uma guerra algures em África, apercebi-me, desde o primeiro dia, que este destacamento para a polícia podia ser como umas férias merecidas. Antes que a guerra tomasse conta de nós, esta era a última oportunidade de respirar a liberdade e apreciar a capital histórica de melancólicos encantos e grande beleza. Os seus bairros medievais de Alfama e Mouraria, o Bairro Alto e a Madragoa, com as suas ruas típicas, dão um toque tradicional e folclórico devido aos seus casarios.
Na primeira semana, fiquei espantado e atónito com as facilidades que dispunham outras armas, das mesmas forças armadas, e para as quais não estava minimamente preparado. Espantoso isto. O regime, a que vinha habituado, era extremamente rigoroso. Não havia lugar a cansaço nem a adormecimento na forma, quanto mais poder-me “desenfiar” do quartel e regressar 3 semanas depois, como se nada tivesse acontecido. Em tempo de guerra fui afeito e formado a nunca transgredir em qualquer situação, a cumprir sem regatear ou sequer questionar qualquer ordem ou dever. Um dia, tive de dar uma marrada sem capacete, numa árvore, caindo como um tordo, só porque o sargento entendeu punir-me, para exemplo de todos, a pretexto de algum abrandamento meu. De uma outra vez, já no fim do curso de combate, depois de uma marcha de 40 quilómetros, durante 4 horas, com botas calçadas e transportando o restante equipamento, chegámos completamente exaustos, esfomeados e sedentos. No refeitório, em vez de uma suculenta refeição para repor o que aquela estafa nos tinha levado, encontrámos, em cima das mesas, um papel em forma de cavalete dizendo: ”isto é a vossa refeição!”.
Chegou, junto de nós, um furriel, sem qualquer postura militar, como se de um civil se tratasse. Depois das apresentações da praxe foi dizendo-nos:
“- Vocês, aqui, são quatro pára-quedistas e vão estar de serviço, um por dia, às rondas no exterior do quartel, portanto…” – colocando um pé no beliche, continuou:
“ – Dizia eu que, como só precisamos de um Pára-quedista de cada vez. Desde que, aquele que cá ficar, assegure diariamente os serviços de ronda, os restantes podem ir para casa.” – olhámos uns para os outros atónitos, mas sem nos atrevermos a dizer qualquer palavra.
“ – Atenção que esse “desenfianço” é por vossa conta e risco. Eu, não disse nada.”
O Furriel com aquele ar de menino do papá, abandonou a caserna, como se tivesse feito um discurso importante.
“ – Ai que caralho, isto é assim?” – interrogou logo o Fiúza.

quinta-feira, junho 15, 2006

RETALHOS - O princípio do fim

A contestação oblíqua ao sistema colonial, de forma camuflada e sobre a capa de reivindicações laborais é afogada em sangue pelas punições militares e paramilitares. Três manifestações, por melhores salários, acabam em morticínios: a 3 de Agosto de 1959, em Pidjiguiti, na Guiné, cerca de cinquenta estivadores são mortos numa acção reivindicada pelo PAIGC – Partido Africano para a Independência de Guiné e Cabo Verde; em Janeiro de 1960, em Mueda, em Moçambique, as forças coloniais massacram centenas de camponeses; em Janeiro de 1961, na Baixa de Cassange, em Angola, milhares de apanhadores de algodão são chacinados. Tudo isto dá lugar à contestação frontal, a 4 de Fevereiro de 1961, em Luanda. Um grupo de nacionalistas angolanos ataca duas cadeias e o quartel da Polícia Móvel com o objectivo de libertar camaradas presos. Este acto violento de revolta e ao mesmo tempo de reivindicação de angolanidade, simboliza o princípio do fim do “3º Império”, do Império Africano de Portugal.
Precisamente uma década depois, nos primeiros dias de 1971, apresento-me, com o Fuíza, o Araújo e o Fitas, em Lisboa, mais propriamente em Monsanto, no GDACI - Grupo de Detecção, Alerta e Conduta da Intercepção. E ali me é atribuído o nº 4/71 sendo alojado numa camarata com outros militares da Policia Aérea.
Ao sermos apresentados aos colegas da caserna, tomo o primeiro contacto com um ex-combatente deficiente. Este tinha uma prótese que lhe substituía não só a bota, perdida algures em Moçambique, mas toda a perna. Restava-lhe apenas um toco onde se aparelhava o apetrecho que o ajudava a mover-se e a deslocar-se todos os dias para a cidade. Tentava dar um novo rumo á sua vida, já que a morte não o conseguiu derrotar. Era um indivíduo extremamente inteligente. Tentava por outros meios refazer a vida, sozinho, preferindo ficar na capital do que regressar à sua terrinha. Com a anuência do comando do GDACI, ali “morava” connosco como se de um militar ainda se tratasse. Tinha “direito” a alojamento e alimentação e procurava romper na vida como técnico de reparação de rádios e televisões.

quarta-feira, junho 07, 2006

Asneiras do Sargentão

Scolari deve estar consciente de que, se falhar, não serão apenas meia dúzia de intelectuais que o vão criticar. Nesse dia, Portugal ficará repleto de intelectuais. A maioria porque não gosta de perder. Os outros porque até gostariam de o ver perder.

Luiz Felipe Scolari é, na minha opinião, o melhor seleccionador que Portugal alguma vez teve. É experiente, tem currículo e, fundamentalmente, é competente. Mas isto não faz dele um homem imune às críticas, nem muito menos evita que, não raras vezes, faça ou diga asneiras.
Scolari é conhecido desde os tempos em que trabalhava no seu país como o Sargentão. E não é por acaso. À sua evidente competência técnica – comprovada pelos inúmeros títulos conquistados – aliou sempre uma personalidade demasiado vincada, roçando a intolerância perante os seus atletas e os seus críticos. Se, no que toca aos jogadores com quem trabalha, até se compreende que goste de impor um certo rigor militar, já no que diz respeito aos que publicamente discordam das suas opções e opinião nada justifica a forma como muitas vezes reage. São traços de uma certa cultura militar e autoritária, que vigorou no seu e no nosso país durante várias décadas do século passado e que, pelo menos nós, portugueses, não queremos nem aceitamos voltar a viver.
O seleccionador nacional, como qualquer homem livre, tem todo o direito de não gostar das críticas que lhe fazem. Tem ainda mais direito de se defender e confrontar os que o criticam. O que não lhe fica bem é que utilize os termos com que se refere, em
entrevistas aos jornais do seu país, a um leque de comentadores que, cá pelo burgo, teimam em contrariá-lo. Toda a razão que pudesse ter, perde-a no instante em que recorre ao insulto.
Outra asneira recorrente de Scolari é a de pegar na bandeira da discriminação e da xenofobia quando se sente atacado. Dizer que os que o criticam o fazem por ele ser estrangeiro é, no mínimo, ridículo e insultuoso para todo o país que o tem tratado nas palminhas. E quem acusa homens como António Pedro Vasconcelos ou Miguel Sousa Tavares de xenofobia demonstra apenas que ainda não percebeu em que país vive. E já lá vão mais de quatro anos...
O que se pede a Scolari, agora, é que trate de fazer aquilo que sabe. Que se preocupe com a Selecção Nacional e a sua participação no Campeonato do Mundo. É por isso que ele será julgado, sendo que deve estar consciente de que, se falhar, não serão apenas meia dúzia de intelectuais que o vão criticar. Nesse dia, Portugal ficará repleto de intelectuais. A maioria porque não gosta de perder. Os outros porque até gostariam de o ver perder.

Manuel Barros Moura

domingo, junho 04, 2006

Musicalidades...

Música...
Música que tráz...
Música que leva...


Música...
Que convida a dançar...
Que faz vibrar, sentir,
agitar todas as partículas do ser...
...do pensamento!

Música...
Que faz avivar, brotar experiências,
vivências passadas,
adormecidas,
paradas, inactivas!
Experiências, no tempo vividas, sentidas...
Marcas que ficaram gravadas,
algures na memória...

Pela música...
de novo reacendidas, activas!
Despertas... entreolham-se,
entrechocam-se...
Marcas... que o tempo não apagou!

Música...
Que leva para longe...
mágoas que sempre esquecemos...
sempre lembramos!

Música...
Que tráz marcas de outros tempos...
Feridas que o tempo não cicatrizou!
Tempo que, às vezes "mata"...
Tempo que, às vezes "cura"...

Música...
Que faz reviver momentos distantes...
que se perderam no tempo,
no espaço,nos meandros da memória!

Música...
Que tráz o tempo que não acontece...
O tempo que desaparece...
O tempo que tráz...
O tempo que leva...
O tempo que, às vezes,
não chega a tempo...

Música...
Que desperta,que tráz de volta,
que nos diz que estamos a tempo...
de viver o tempo!

Música...
Que nos leva ao tempo que era...
ao tempo que foi...

É tempo de dar tempo...
ao tempo... que teima em não
chegar a tempo!
É tempo de viver o tempo!
Pela Música...essa, sem tempo!
Pela Música... sempre em tempo,
e no tempo!
Pela Música...intemporal!!
É tempo de viver!!


Lila Loureiro
2006, Viana do Castelo