segunda-feira, julho 17, 2006

RETALHOS - O povo não queria guerra

Com mais uma fornada pronta, de Caçadores Pára-quedistas, era o sinal de que estava iminente mais um embarque para África.
Maio corria velozmente para o fim e eu era rendido na Polícia Aérea sendo colocado de novo em Tancos. Aqui reencontrei camaradas do meu curso que só aguardavam sinal verde, tal como eu, para embarcar junto desta última fornada e, desta vez, falava-se que seria para Angola.
O Golpe de 28 de Maio de 1926, foi um pronunciamento militar que pôs termo à Primeira República, levando à implantação da auto-denominada Ditadura Nacional, depois transformada, após a aprovação da Constituição de 1933, em Estado Novo, regime que se manteve no poder em Portugal até à Revolução dos Cravos de 25 de Abril de 1974. O Golpe de 28 de Maio começou em Braga, comandado pelo general Gomes da Costa, seguida de imediato em outras cidades como Porto, Lisboa, Évora, Coimbra e Santarém.
Em 1971, 45 anos depois, estávamos desfilando em Braga, cidade que conta com mais de 2.250 anos nos Anais da História e uma das cidades cristãs mais antigas. É, ainda, considerada como o maior centro de estudos religiosos em Portugal e pode, realmente, estar muito orgulhosa do seu título de "Cidade dos Arcebispos". O povo veio à rua aclamar os seus soldados que iam subindo a Avenida da Liberdade. As pessoas apinhavam-se nos passeios, vibravam num misto de aplausos e de emoções, as pétalas de flor arremessadas das janelas voavam como se de pequenos pára-quedas se tratassem. O marchar característico dos Pára-quedistas e o som das botas em uníssono, ecoava ao longo do percurso.
Foi de facto fantástica a recepção que nos esperava no Campo da Vinha, onde as tropas chegavam e alinhavam em formação com os seus estandartes. As casas engalanadas com as suas varandas e janelas polvilhadas de colchas e bandeiras, davam um ar festivo e um acolhimento aos bravos soldados que em breve partiriam para a guerra.
O povo anónimo e as suas famílias vitoriavam a bandeira e os seus soldados. O povo não queria guerra. O povo sabia que esta parada militar era uma antecâmara da guerra e que muitos dos que agora vitoriavam, não voltariam tombando no capim ensanguentado. E o regime apropriava-se indevidamente destes sentimentos.

5 comentários:

Anónimo disse...

Obrigado por este bocadinho maravilhoso da nossa história, para além da parte politica que revivi aprendi que Braga é um grande centro de estudos religiosos... Sabes Zé, por vezes sinto-me muito pequenina, porque há tantas coisas lindas por aprender sobre o nosso pais...
Um beijinho
Dia

Anónimo disse...

Consegue passar a história do local,mesclada com o sentimento do povo acolhedor aos jovens que logo partiriam para a guerra que ninguém nunca quer.
A aclamação do momento,o ar festivo amenizava a angústia vivida por esses jovens e suas familias.
Ligia

José Marques disse...

Amigo Jacky.
Depois da guerra procuraste uma vida melhor para ti e fizeste bem. Portugal nunca soube cuidar bem dos seus filhos, em especial os que pela guerra passaram.
Não sei muito bem como se chamava o marchar cadenciado dos pára-quedistas, que era e é ainda único.
Era um marchar cansativo mas também muito apelativo à nossa auto-estima. Não sei se gostava mais de assim marchar ou ver marchar os nossos colegas.
Um abraço

José Marques disse...

Dia,
Tenho o cuidado de nas minhas memórias, dar também a conhecer um pouco por onde passei e a história que a esses lugares está ligada.
Tens razão, temos um país lindo

Anónimo disse...

teu texto esta tao bém escrito, que consegue se imaginar os passos dos paras andando naquela rua, as pessoas as janelas e nas ruas aclamando esses herois...
E também deu para aprender um pouco de historia recente do nosso pais, datas e acontecimentos que desconhecia...
bjos