quarta-feira, maio 31, 2006

RETALHOS - Não sei para onde vou… mas vou III

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Com aquelas palavras do “velho” Boina Verde, que a sociedade vianense considerava um pé rapado e renegava por ser uma pessoa humilde proveniente de famílias pobres, mas honradas, desta cidade, aprendi bastante. Descobri, muito novo, que a pátria não reconhecia os seus melhores filhos, aqueles que davam a sua juventude, o seu sangue e a sua própria vida para defender… nunca soube muito bem o quê!
A miudagem de pé descalço, admirava o senhor Magalhães, o velho pára-quedista. Ele era um símbolo para nós, pois tratava-se de um verdadeiro combatente. Palavras sábias as deste homem marcado pela vida e pelo ostracismo da pátria. Sempre que alguém me perguntava, se me tinha safo da guerra eu só respondia:
“- Não sei para onde vou… mas vou.”
A televisão mostrava um povo a preto e branco que ostentavam lenços brancos, de pureza imaculada, na Cova da Iria. O aceno de despedida à Virgem era idêntico ao da despedida do filho num cais, na hora do embarque.
Deixavam para trás uma recém-casada e uma promessa de fidelidade extrema, para o que desse e viesse. O pranto e a alma destroçada da mãe que, vendo o filho partir, via-se, a ela própria, a esvair-se em sangue como aquele que tantas vezes encharcou a picada.
“Adeus, até ao meu regresso” e muitos regressaram vivos e inteiros. Outros regressaram vivos, mas não inteiros e houve ainda os que não regressaram. E há ainda aqueles que, tendo regressado, deixaram lá ficar a alma.
Quando regressámos daqueles parcos dias, a que pomposamente chamaram férias, mas que também podiam ser um prelúdio da morte anunciada para as terras quentes de África, faltaram uns quantos. Estes, tinham decidido dar o salto para a França em busca da vida e não da morte. Foi-lhes colado o rótulo de desertores, pelo RDM, pelo regime e seus aficionados, mas o povo anónimo, esse que labutava nos campos e nas fábricas, nunca os condenou por fugirem à guerra.

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1 comentário:

Anónimo disse...

Terrivel a guerra!!!!Tantas mudanças nas vidas das pessoas.tantos sofrimentos,revoltas,e marcas que jamais se apagarão.Ligia