quinta-feira, dezembro 29, 2005

RETALHOS - Preparação para a guerra I

Musica em fundo: Ballad of The Green Berets


Depois de mais uma viagem numa noite interminável e atribulada, mas saborosa, de fim-de-semana, a meados do mês de Setembro de 1970 lá estou de novo no Regimento de Caçadores Pára-quedistas em Tancos. Quando dou comigo, encontrando-me em formatura na parada para nos ser apresentado o Capitão Gomes, comandante do Curso de Combate que visava fundamentalmente a preparação para a guerra. Segundo se contava, e eu vim a confirmar isso muito mais tarde, este oficial era um autêntico especialista no tipo de guerra que se travava em Angola, Guiné e Moçambique, aliás, como tantos outros que as forças Pára-quedistas tinham no terreno.
Para mim, que só ambicionava ser Pára-quedista, esta última etapa era perfeitamente dispensável para as minhas ambições. Ser Pára-quedista, ostentar com orgulho a Boina Verde e no peito o Brevete era o corolário do trabalho desenvolvido ao longo de quatro semanas e que culminaram no prazer de voar, de contemplar a terra tão pequena lá em baixo. É indescritível a sensação de paz e tranquilidade que o contacto com a natureza no seu estado mais puro nos proporcionava. É o voar com o silêncio e com a ausência de peso.
Até Ícaro se deslumbrou com a bela imagem do sol e sentindo-se atraído, voou em sua direcção, acabando por deixar a cera de suas asas rapidamente se derreterem e acabando por cair no mar - apesar de ser sem dúvida um deslumbramento, tal o domínio que se sente sobre a terra, pela sensação de liberdade e poder - não se pode perder o discernimento, pois aqueles segundos passam demasiado depressa e os procedimentos a cumprir durante o voo não permitem veleidades.
Dei comigo a pensar cá com os meus botões:
- “Caramba, afinal para ser Pára-quedista ainda preciso de fazer muito mais?”
Fui acordado destes pensamentos com o vozeirão do sargento que comandava a formatura:
- “COMPANHIAAAAA. SÉEEE… UP” (Voz de sentido)
- “DÁ LICENÇA MEU CAPITÃO… COMPANHIA PRONTA.
- “Mande descansar” – diz o Capitão Gomes
Com a cabeça em completa turbulência - mais parecia o Noratlas quando ligava os motores para me levar a voar nos céus do Arripiado - ia retendo algumas frases chave do discurso mobilizador que o capitão no seu (porte altivo apesar da imagem (falsa) que a sua cara de bonacheirão, que parecia transmitir) nos ia passando:
- “O curso de combate está pensado para dotar o Pára-quedista de competências técnicas e de tácticas de combate para o cumprimento das missões necessárias na guerra. “ – e continuava dando especial ênfase a algumas frases:
.../...

5 comentários:

Anónimo disse...

Li atentamente todas as passagens que relatas nos teus "retalhos" e, revi-me em algumas delas, dada as experiências similares, já que fui também Pára-quedista, no período de Março de 1972 a Dezembro de 1974.
Pela clareza e rigôr da tua escrita e, pela capacidade de expressares sentimentos, emoções e sensações, que só quem tem a honra de usar, ou ter usado, a Boina-Verde, é que detem no seu património pessoal. Por ser mais um contributo para se ficar a conhecer o verdadeiro sentido do lema: Que Nunca Por Vencidos Se Conheçam!

Um abraço do João Moreira

José Marques disse...

Obrigado pelo incentivo.
De facto a passagem pelos pára-quedistas, é bem ilustrada no subtítulo dos RETALHOS, que apesar de ter sido muito duro e com uma guerra pelo meio.
“Não importa o que o passado fez de mim. Importa é o que farei com o que o passado fez de mim.”
O passado fez de mim, uma pessoa mais preparada e mais solidária
Um abraço João

Anónimo disse...

Escrita muito interessante e de fácil leitura, que pede um livro o mais rápido possível.
Parabens Marques, gosto de lêr o que escreves, não estive na guerra, mas fui (sou)Pára-quedista e entusiasmo-me com este tipo leitura.

Jorge martins

Anónimo disse...

párabens, gostei muito, escrita fluida e de facil leitura, os ingredientes necessários para nos prender nesta aventura...
Alguma coisa coloco-me ao dispor
um Abraço

Anónimo disse...

Todos os anos nesta data paramos para refletir sobre o que fizemos e o que deixámos de fazer. Tentamos pôr num pedaço de papel aquelas resoluções que mais desejámos serem transformadas em realidade. Esquecemos de escrever nesse pequeno pedaço de papel a importância de manter acesa a chama da AMIZADE.
Assim, desejo um 2006 repleto de realizações e que as resoluções saiam do papel para a concretização.
Beijo
Céu